As (minhas) palavras tóxicas
-Fala! Diz alguma coisa, pelo amor de Deus!
Permaneci calada, os olhos vidrados nas minhas botas gastas pelo uso. Sinto o olhar dele a cravar-se no meu crânio como se tentasse, de alguma forma, ler-me os pensamentos.
-Não vais dizer nada?
Abanei a cabeça em reposta. Já disse tudo o que tinha para dizer.
E mesmo que houvesse ainda algo atravessado na garganta, engolia as palavras e obrigava-me a permanecer no silêncio. Quando se diz a coisa errada, não há como voltar atrás. Não é como quando nos enganamos na rua e podemos sempre fazer marcha atrás com o carro e ir em busca da certa.
O que é dito fica escrito nas mentes e corações daqueles cujas nossas palavras magoam mais do que outra coisa qualquer - porque no fundo, as palavras só magoam quando proferidas pela pessoa que mais poder tem para nos infligir tamanha dor.
-Sabes uma coisa? Ás vezes o teu silêncio é pior que todas as tuas palavras juntas, ditas aos gritos e aos pontapés.
Fiz-me olhá-lo nos olhos, a custo. O meu coração sofre com tal ousadia.
Não é não. Acredita. Porque se calo e consinto é porque as palavras que poderiam jorrar de mim, iriam provavelmente destruir tudo.
As minhas palavras são tóxicas.
O silêncio é a minha única defesa - e por conseguinte, a tua também.
As palavras ecoam na minha mente mas os meus lábios não se movem para as reproduzir. Viro-lhe costas sem olhar para trás, dizendo a mim mesma mais do que uma vez que esta é a coisa certa a fazer.
As minhas palavras são tóxicas - se para alguém mais do que ninguém, esse alguém sou eu.
Porque o silêncio que dou aos outros, não o posso providenciar a mim mesma. As palavras ressoam na minha mente, sem terem por onde escapar e, aos poucos, corroem-me.
No entanto, se tiver de corroer alguém com as minhas palavras, que seja a mim mesma.